Simulação com nova modalidade de crédito imobiliário revela parcelas mais baratas, mas instabilidade da inflação ao longo dos anos oferece riscos aos contrato.
Recebida com grande expectativa pelo mercado imobiliário e em vigor desde o último dia 26, a correção dos contratos de financiamento imobiliário pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) junto à Caixa Econômica Federal pode ser um bom negócio para os consumidores, mas também oferece riscos devido à flutuação do índice.
A simulação de empréstimo com as novas taxas ao consumidor já está disponível no site do banco e o Diário do Nordeste, com o apoio do núcleo de dados do Sistema Verdes Mares, verificou as modalidades na página da Instituição financeira. A pesquisa constatou a diferença de até 52% entre os financiamentos atrelados ao IPCA e à Taxa Referencial (TR). Na soma das prestações, a diferença chega a 36%.
De acordo com as simulações, a primeira parcela para um imóvel residencial novo de R$ 400 mil, financiado com 30% do valor como entrada e pela tabela Sistema de Amortização Constante (SAC), com a modalidade de correção pela TR mais juros, foi estipulada em R$ 3.045,33. Enquanto isso, na modalidade IPCA mais juros, a primeira prestação foi estimada pela Caixa em R$ 1.995,68.Até antes de começar a vigorar a correção dos contratos de financiamento imobiliário pela inflação, a TR era o parâmetro padrão para esse tipo de tomada de crédito. Atualmente, a taxa está zerada e, nos empréstimos firmados junto à Caixa Econômica, são acrescidos a um percentual que pode variar entre 8,5% ao ano e 9,5% ao ano, a depender de alguns fatores como o nível de relacionamento do comprador com o banco.
No caso do IPCA, o índice é acrescido a um percentual que deve variar entre 2,95% e 4,95%, também de acordo com o nível de relacionamento do consumidor com o banco. De acordo com a Caixa, a correção considera a inflação acumulada nos últimos 12 meses (hoje em 3,22%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE).
A novidade vale, de acordo com o banco, para contratos tanto do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) como para o Sistema Financeiro Imobiliário (SFI). Para utilizar a atualização pelo indexador IPCA, a tomada de crédito deve ser com pagamento em prazo máximo de 360 meses (30 anos) e o comprador poderá financiar até 80% do valor.
"Impossível prever"
Entretanto, o conselheiro Lauro Chaves, do Conselho Federal de Economia (Cofecon), destaca que "é irresponsável uma simulação pelo IPCA, considerando que não há como prever qual será o índice nos próximos meses ou ainda nos próximos anos".
"O que nós podemos dizer é que estamos em um nível de inflação bem mais baixo, o que representaria um grande benefício ao mutuário. Entretanto, esse indexador embute um grande risco. Uma grande crise poderia trazer a inflação de volta. E não precisa ser 2.000%. Um IPCA a 10% ao ano já mudaria muita coisa".
Ele lembra que, em 2015, a inflação chegou a marcar quase 11% ao ano, mas pondera que "dificilmente a população aceitará que algum governante adote uma política irresponsável" que possa catapultar novamente o índice a este patamar. O economista também considera que pressões internacionais podem, sim, respingar na inflação brasileira. "Mas são coisas solucionadas em um médio prazo", avalia.
Diante das ponderações, o conselheiro avalia a nova modalidade em vigor como positiva. "É melhor ter um financiamento atrelado ao IPCA do que um subsídio que toda a sociedade vai pagar por ele. Eu sou a favor do subsídio imobiliário apenas para a população de baixa renda. Não há por quê a sociedade inteira financiar imóveis de alto padrão", assinala.
O economista sócio da Arêa Leão Consultoria, Gilberto Barbosa, também pondera que o consumidor deve avaliar cuidadosamente os pormenores da operação. "Hoje, as taxas estão baixas, mas se considerarmos o histórico do Brasil nos últimos dez anos, houve uma variação expressiva. Essa diferença em uma dívida tão longa pode afetar as parcelas de uma forma significativa, 30 anos é um prazo muito longo, entram e saem vários governos. Ao optar pela modalidade, o consumidor assume uma incerteza", diz.
Compensação
Ele explica que a lógica da operação utilizando o IPCA como indexador é um spread mais baixo, portanto, parcelas mais baixas em um curto e médio prazo. "Conforme o tempo vai passando, o financiamento deve ficar com parcelas maiores que a operação feita pela TR. Em um curto prazo, para o consumidor, é melhor porque ele vai pagar menos. Só que ao longo do tempo, a parcela vai ficar superior à prestação da TR".
Barbosa explica ainda que uma alternativa para se proteger de variações futuras no IPCA optando por essa linha de crédito é investindo em um título público atrelado à inflação. "Como a prestação vai ser menor, se o cliente poupar parte da diferença, pode utilizar esse instrumento no mercado financeiro para se proteger na ponta do ativo".
Assim, à medida que o IPCA acelerasse, o contrato seria reajustado, mas o título também passaria a ter mais valor. "Em um estouro na inflação, o investimento se valoriza e o consumidor pode usar aquele rendimento para compensar uma perda", detalha Barbosa. Ele também reforça que um financiamento em um prazo menor poderia deixar o comprador menos exposto às flutuações do índice.
Para a corretora de imóveis credenciada à Caixa Econômica Federal, Bia Pontes, a linha de crédito deve levar muitas pessoas que sonhavam em adquirir a casa própria a virem, de fato, a comprá-la. "Os próprios corretores estão ansiosos com essa possibilidade. Há uma expectativa muito grande de aquecimento do mercado imobiliário", diz.
É o caso do desenvolvedor de softwares Sérgio Junior, que em até um ano espera adquirir um imóvel próprio. Ele pretende comprar um apartamento de até R$ 450 mil e se animou com a possibilidade de ter acesso a parcelas de menor valor. "Eu andei analisando financiamentos com um banco privado e, quando soube da nova modalidade, comecei a pesquisar sobre", diz Sérgio Júnior, acrescentando considerar a possibilidade.
A corretora avalia ainda que a TR confere uma boa margem de segurança aos contratos imobiliários, mas acredita que "as expectativas de dias melhores com a tramitação da reforma tributária e da reforma da Previdência" podem indicar um bom negócio na operação com a modalidade IPCA. "Não podemos calcular o que vai ser no futuro, mas, diante das mudanças, a tendência é que a economia vá melhorar".
[ FONTE DIÁRIO DO NORDESTE ]
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